24.11.13

convite: projecto: afectos

como escrevi no meu facebook:

"boa gente,

alguém gostava de participar dum projecto tipo feel tank chicago - em escala menor, se necessário - por estes lados? acho urgente fazer certos tipos de trabalho público & político em torno dos afectos; acho que o feel tank oferece um modelo forte de algumas possibilidades de investigação & intervenção; uma certa articulação entre teoria dos afectos & trabalho político que me (nos?) faz muita falta.

linhas na minha cabeça que gostava de reconstruir colectivamente:

1) "SÊ FELIZ": ouçam para alguém como eu, ango-depressivo/bipolar/o que raio que eu seja no quadro da subtileza diagnóstica, dá-me cabo dos cornos a imposição normativa da "felicidade", como se o sucesso, valor e sentidos da experiência se definissem exclusivamente em função de um binário "bom"/"mau" em que tudo o que é mau suprime-se. temos índices internacionais de felicidade, quantificações científicas da satisfacão; teorias "objectivas" do afecto modeladas a partir da teoria quântica; livros de psicologia pop a empurrar-nos o pensamento positivo goelas abaixo... não quero viver numa cultura de caras contentes; quero viver numa cultura de corpos completos. quero participar duma crítica da imposição do afecto positivo; quero perceber-lhe as dimensões políticas enquanto método de domesticação da cidadania contemporânea e quero participar da abertura do espectro e da legitimação do negativo & pesado & difícil.

2) DEPRESSÃO & POLÍTICA: uma das características-chave da patologia mental é que isola & aliena o sujeito, que é tomado por singular na sua experiência da sua própria estrutura cognitiva & afectiva. a identidade colectiva (e a identidade política implicada) não participam dos discursos hoje dominantes sobre a psicopatologia: o psico-diverso está isolado (e não articulado) e o seu problema é individual (e não colectivo). mas há dimensões em que as estruturas mentais derivam de estruturas materiais; são sintomáticas delas e são potenciais ferramentas de diagnóstico do social. temos de pensar a depressão enquanto um facto colectivo, e um facto político. a) criar sentidos colectivos de experiências psiquicamente não-normativas & b) mobilizar politicamente esses sentidos (p. ex., contra as dimensões coercivas da instituição psiquiátrica).

3) AFECTOS QUEER: em termos pessoais: quero preservar o meu direito à mágoa & à raiva. em termos colectivos: entre outras coisas, gostava muito de fazer uma colectânea de testemunhos em torno dos nós afectivos negativos da vivência queer: um anti-"tudo vai melhorar": um arquivo de raiva, desespero, impotência, perda, luto, desistência, hesitação, exaustão. quero juntar relatos de activistas, de artistas, de quem seja, do que é o espectro da experiência afectiva lgbt contemporânea, para lá do mar de rosas que certos focos homonormativos pretendem representar. quero falar do que e como magoa; acho que importa como forma de partilha, como forma de memória, como forma de acção.

4) PRECARIEDADES EMOCIONAIS: temos quantificações frequentes, actualizações estatísticas constantes, índices nacionais e internacionais; mas acho que não temos forma de registo satisfatório das implicações afectivas plenas da crise; não temos ainda desenvolvido com precisão suficiente um sentido de como a crise económica se manifesta numa crise emocional; de como da crise social deriva uma crise subjectiva. coisas a pensar neste contexto: índices mais elevados de suicídio e sintomas depressivos em diversas populações ocidentais no contexto da crise económica; coisas a fazer: a) perceber das consequências completas do tecido económico no tecido afectivo, b) articular melhor o material e o mental, c) instrumentalizar os afectos enquanto ferramentas de diagnóstico político, d) legitimar um arquivo afectivo da crise enquanto forma de memória histórica & crítica.

isto interessa a alguém?

*s,

daniel



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